3.6.03
(03/06/1926-05/04/1997)
Arte é ilusão, pois eu não ajo
Fico ou Parto - com constante alegria
Meus pensamentos, embora céticos, são sagrados
Santa prece para o conhecimento ou puro fato.
Então enceno a esperança de que posso criar
Um mundo vivo em torno de meus olhos mortais
Um triste paraíso é o que imito
E anjos caídos cujas asas perdidas são suspiros.
Neste estado não mundano em que me movimento
Minha Fe e Esperança são diabólica moeda corrente
Em mundos falsificados, cunho pequenos donativos
Em torno de mim, e troco minha alma por amor.
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Trechos da Entrevista de Allen Ginsberg à Folha dois dias antes de sua morte, aos 70 anos
por Eduardo Simantob da Publifolha
A morte de Allen Ginsberg, ocorrida anteontem, não deixa lacunas. Durante meio século o escritor americano dedicou-se não só a uma extensa obra poética, como também ao ensino da literatura como ato de liberdade e militância político-ambiental. E a mensagem já está dada. Ginsberg escreveu bastante, falou mais ainda e participou combativamente das transformações da América do pós-Guerra. Lutou contra a censura, combateu a proibição do LSD (1966), protestou contra a guerra do Vietnã, contra as armas nucleares e militou pela preservação da natureza.
Em 1994, Ginsberg foi procurado pela Folha para falar sobre o escritor William Burroughs, que na época completava 80 anos de idade. A entrevista, inédita, acabou se estendendo à sua poesia, ativismo e ecologia. A seguir alguns trechos.
Folha - Como o senhor resumiria a importância de William Burroughs na literatura americana?
Allen Ginsberg - Burroughs tem uma influência na cultura dominante americana muito maior do que ele mesmo imagina. Devido ao processo contra seu livro ''Almoço Nu'', ele abriu as portas da censura para que novos autores escrevessem o que quisessem. Muitos dos seus temas continuam e continuarão importantes, como controle do pensamento, drogas, sexualidade gay, Estados policiais etc. Mesmo na cultura pop, bandas como Steely Dan e Soft Machine devem seus nomes a títulos de livros seus e, mais ainda, à técnica dos cut-ups (colagem de textos e imagens não tão ao acaso, desenvolvida por Burroughs e pelo pintor Brion Gysin nos anos 60).
Folha - Hoje os ''beats'' estão virando moda na América, a mídia dando às suas obras um espaço até hoje inédito. Isso é uma surpresa?
Ginsberg - Não. Creio que a obra ''beat'' é tão forte que já pode ser tomada como referência literária. Nós tocamos em questões permanentes: o império americano, ecologia, revolução sexual, censura. Também há a questão do ''terceiro caminho'', nem comunismo nem capitalismo, que pregávamos enquanto os intelectuais procuravam extremos do marxismo ou do anticomunismo. Nossa preocupação é alterar estados de consciência e achar soluções ecológicas, não ideológicas.
Folha - Mas isso também pode levar a interpretações variadas do que se diz ou escreve, não?
Ginsberg - Meu negócio é poesia. Ao produzir não posso controlar o que as pessoas farão depois, dizer o que elas devem fazer com suas próprias mentes. E nem gostaria, eu seria um ditador. O melhor que posso fazer é propor alternativas e me abrir às pessoas que queiram aprender comigo.
Folha - E qual é sua principal preocupação hoje?
Ginsberg - O problema básico é o da hipertecnologia consumindo o planeta numa escala que destruirá as possibilidades humanas. Li hoje uma entrevista de Jacques Cousteau (oceanógrafo francês) em que ele diz: ''Estou agora lutando pela minha própria espécie, buscando conceitos para as gerações futuras''. Para ele, o divórcio entre a humanidade e a natureza é irreversível, mas o homem deve se lembrar que ainda depende da natureza. Mas, como eu, ele tem esperança no futuro.
Folha - E há futuro na literatura americana?
Ginsberg - Há um presente. Quem estiver escrevendo, em qualquer língua, está levando a literatura para frente, mas deve sempre se lembrar que a imortalidade só vem depois.
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